Estamos assistindo de nossas poltronas, cadeiras e sofás, há quase um ano, a mídia internacional hostilizar e acusar o presidente da Síria, país que parece ser a bola da vez nas revoluções instigadas via mídia e redes sociais, com uso das novas tecnologias e internet.
No início, tínhamos 'protestos pacíficos' (a exemplo de como começou em outros países), os quais foram sendo amplificados via mídia até o ponto de se tornarem o foco de uma rebelião. Na sequência, como mágica, surgem grupos armados, milícias e um exército insurgente que tem armas modernas e enfrenta o poder constituído quase de igual para igual. Além de armas, todo um aparato de apoio e inteligência militar.
Novo flash: com o surgimento forçado de conflitos armados, já que os insurgentes (antes manifestantes pacíficos) começam a impor por armas a tomada de cidades, vemos a mídia internacional exigir algum tipo de intervenção externa no país ou sanções contra o presidente. A ONU entra em jogo e tenta criar um plano de paz - totalmente inútil, já que os insurgentes, armados pelo ocidente via países amigos na região (Turquia, Arábia Saudita, etc.) não estão interessados na paz, como não estavam desde o princípio e, juntos com os militantes externos, trabalham para boicotar o plano.
Para justificar uma futura invasão por parte das tropas imperiais (OTAN, ou NATO em Inglês), a mídia internacional novamente sobe o tom, acusando a ONU de inércia e a Rússia de vetar, no Conselho de Segurança, sanções ao país. Mostrando as vítimas de um só lado do conflito e creditando todas as mortes, mesmo que em confrontos, ao 'governo tirânico de Assad', criam o ambiente para uma percepção mundial negativa do atual governo sírio, o que justificaria qualquer tentativa de destroná-lo. É a mídia no papel de construção da imagem do outro desconhecido, moldada como uma máscara para fazê-lo parecer bom ou malvado.
Assad convoca eleições parlamentares, obtendo esmagadora maioria de votos para os membros do seu partido: analistas internacionais denunciam a eleição e dizem que 'o momento não era apropriado'. Se o povo sírio, em sua totalidade, detesta seu presidente, por que tanta gente ainda vota nos representantes do Baat, partido pelo qual foi eleito, justamente em uma hora de crise nacional?
Novas hostilidades, um massacre de civis em uma área fortemente controlada pelos insurgentes - 'a culpa é, presumivelmente, de milícias pró-Assad'. Como? Se insurgentes controlam aquela área com unhas e dentes, como milícias do outro lado entrariam lá e matariam só civis (mais de cem), abandonando a área a seguir - sem que ao menos houvesse combate? Se atacaram uma área controlada pelo FSA (Exército de Libertação Síria), porque a abandonariam logo a seguir? Uma escaramuça? Sem que ninguém visse ou sem que os insurgentes pudessem fazer nada contra, mesmo dominando a cidade inteira e a região?
Mesmo sem ter determinado a exata autoria do trágico evento, culpam os 'shabiha', que seria essa tal milícia pró-Assad. Sabemos que na Síria, além do conflito político incentivado pelo ocidente, temos agora a re-ignição do secular conflito entre seitas islâmicas -shiitas/alawitas (a minoria, com cerca de 10 % a 15% da população) e sunitas (cerca de 70% do total). Os que morreram pertenciam justamente à maioria. Novo massacre, agora contra trabalhadores públicos - a mídia agora não culpa ninguém, diz que um lado responsabiliza o outro. Agora não há condenação internacional ...
Tudo nesse conflito é nebuloso, menos nossa certeza de que é muito manipulado e induzido pelos interesses ocidentais. Já se fala abertamente em atacar o Irã ou o Iêmen logo a seguir, dando sequência ao dominó de regimes árabes derrubados com ajuda externa, para atender em boa parte a interesses externos. Ao que tudo indica, o Irã, por sua importância estratégica e riqueza em petróleo é a verdadeira meta final de todo esse processo. A percepção ocidental sobre Assad, durante as décadas de governo de seu pai, Hafez-Al-Assad, era de um aliado ocidental moderado: bastou seu filho comerciar com a Rússia e China para virar inimigo irreconciliável do ocidente e de seu próprio povo. A Guerra Fria acabou mesmo?
Curiosamente, outros países considerados aliados, que têm práticas e modelos políticos questionáveis, além de manterem diferenças de tratamento bem marcadas quanto ao sexo - sem falar da discriminação das minorias - tais como Arábia Saudita e Emirados Árabes, não são molestados pelo ocidente. Pelo contrário, tudo é feito para blindá-los e impedi-los de fazer parte do dominó, quero dizer, da primavera árabe. Nesses países, nos quais o poder político também é autocrático (monarquias) e nos quais os costumes também são tradicionalistas e onde a ligação entre Estado e Religião é absoluta, não se incentiva a criação de protestos libertários e muito menos de 'exércitos insurgentes': aqui não haverá revolução!